Merenda milionária, fome de transparência: o escândalo de R$ 33,6 mi em Palmas e a herança sombria da “máfia da merenda” no Brasil”
- Wasthen Menezes

- 26 de set.
- 3 min de leitura

Merenda contra o povo — e contra o futuro
Palmas acaba de entrar para a galeria das prefeituras sob suspeita de corrupção com causa nobre: a alimentação escolar. Uma contrato emergencial de R$ 33,6 milhões para merenda escolar, sem licitação, está sob investigação por superfaturamento, ausência de justificativa para a dispensa e falhas de transparência, segundo o TCE-TO.
Mais grave: o contrato quase dobrou o orçamento previsto para merenda na cidade (R$ 18,5 milhões), e itens básicos foram cotados a patamares exorbitantes — exemplo: pacote 500 g de flocos de arroz avaliado em R$ 41,30, enquanto o preço de mercado gira entre R$ 3 e R$ 4. O poder público nomeia “emergência” para acelerar contratações, mas a aula já era conhecida — o ano letivo sempre existe. A “emergência” virou cortina de fumaça.
A secretária de Educação Anice de Souza Moura e outros gestores foram formalmente citados e têm prazo para defesa. Contudo, a suspeita é de que, para além dos nomes, o padrão de operação é o mesmo que assola o país: favorecimento, cartas marcadas, superfaturamento e omissão de controle.
Ecos de um país marcado pela “máfia da merenda”
O escândalo em Palmas não é exceção — é parte de um padrão que já ganhou nome nacional: a Máfia da Merenda.
Exemplos a não esquecer:
Operação Alba Branca (São Paulo, 2016) — cooperativas de agricultura familiar foram acusadas de cartel para fraudar licitações de merenda em dezenas de municípios paulistas, manipulando preços e beneficiando empresas ligadas ao esquema.
Operação Gabiru (Alagoas, 2005) — investigação da Polícia Federal que revelou desvios de recursos federais do FNDE em municípios alagoanos no fornecimento de merenda escolar. O prejuízo estimado: R$ 150 milhões.
Caso Santa Catarina / contratações terceirizadas — auditoria do Tribunal de Contas do Estado encontrou falhas no cumprimento da lei que exige 30% de compra da agricultura familiar, superfaturamento e omissão de controle.
Prefeitura de Manaus — denúncia de superfaturamento em licitação de alimentos para merenda escolar, com indícios de conluio entre empresas.
Sergipe — reportagens revelaram fraudes em contratos de merenda em municípios do estado, desencadeando investigação estadual.
Esses casos têm em comum: fragilidade institucional, poder local que age com proteção política, e um mecanismo de contratação que concentra poder nas mãos de poucos.
Porque esse caso é “mais um — mas potencialmente maior”
Escala financeira: R$ 33,6 milhões é valor expressivo para uma cidade; desafia lógica orçamentária.
Contratação emergencial: o uso da dispensa legal como mecanismo sistemático de bypass das normas de licitação — típico em casos de corrupção.
Descompasso com o planejamento: emergência não pode ser desculpa para má gestão crônica.
Falta de controle local: empresas sem sede no município ou no estado geram risco logístico, mas também menos vinculação política local.
Portas abertas para cartel e conluio: cláusulas de edital que favorecem grupos específicos, ausência de concorrência real e superfaturamento são ingredientes repetidos em esquemas.
Se essa investigação for conduzida com isenção — e com pressão social — poderá servir como marco para endurecimento da fiscalização do uso de recursos públicos em alimentação escolar.
Convocação à sociedade e ao controle
Fiscalização social intensa — conselhos escolares, pais, entidades civis: exijam detalhamento do contrato, planilhas, notas fiscais e controle.
Ministério Público de Contas e MP estadual — não podem admitir investigação “morna” ou arquivamento sem completas respostas.
Tribunal de Contas e instâncias superiores — auditar os casos de superfaturamento, exigir ressarcimento, aplicar sanções firmes.
Imposição de transparência — que se publique em portal da transparência item a item do contrato emergencial, com preços comparados ao mercado.
Pressão política — legislativo local deveriam abrir CPI ou comissão especial para apuração, inclusive responsabilização política.
Um alerta final
O escândalo em Palmas é o espelho distorcido de um mal estrutural no Brasil: quando se mexe com a merenda de crianças, o impacto social transcende números. É sobre dignidade, direito básico e futuro. É preciso mais do que auditagem: é hora de ruptura.




Desse jeito vai quebrar!
Palmas precisa tomar direção.